A tristeza já há algum tempo se instalara naquele lar. Casa singela que, outrora fora palco de alegria e fartura, aonde tudo resplandecia em limpeza e amor, hoje tem em seu interior na marca do desânimo e do desespero.
Ao ultrapassar a sua soleira, aqueles mais sensíveis, podem sentir o clima de desarmonia e intranqüilidade que ali reina, com seu ar pesado e sobrecarregado de eflúvios deletérios; suas paredes, piso, teto, instalações elétricas e hidráulicas, tudo apresenta sinais de descaso, necessitando reparos.
Os poucos móveis que ainda restam têm carência de conserto, pois a mesa, pensa e encostada à parede, quase não serve para o fim que se destina; o sofá furado, é sustentado por uma lata cheia de areia; a cama, equilibrada por tijolos furados que substituem uma de suas pernas, tem o colchão rasgado, uma medrança de fungos e ácaros que, vez por outra são massacrados pela ação do ferro de engomar, já que a tábua de passar se inutilizara pelo uso.
Eletrodomésticos, quase não os tem. A geladeira carcomida pela ferrugem tornou-se um depósito de água, enquanto a velha TV, em um canto da sala, ainda funciona, às vezes, a pancadas, quando apresenta defeitos momentâneos.
No armário, o conjunto de mantimentos vazio é a prova de que ali a alimentação é escassa e incerta, pois certas mesmo, são as idas e vindas à casa dos genitores, em busca de paliativos às necessidades dos filhos.
A mulher de olhar triste e vago, desanimada e taciturna, com olheiras a marcar-lhe o semblante que, tenta disfarçar com um sorriso amargo, tem os cabelos quase sempre desalinhados ou em forma de coque, apática, com vestuários a desejar e sandálias nos pés, é o protótipo da desolação.
Tem dois filhos. Um de oito e outro de sete anos, magros, de fisionomias sofridas, desolados e desconfiados, como que estivessem assustados. Já não vão à escola, e, em suas vestes simples, vê-se que a situação da família não é boa.
Vive em tensão constante, pois o seu matrimônio está ameaçado. Já não existe clima entre eles. Como se não bastasse, está as voltas com agiotas, SPC e cartórios de protestos. A prestação da casa, contas de água, e luz vencidas, cobradores à porta e desacatos de credores.
Seu marido, homem jovem, mas alquebrado, ainda empregado, é alcoólatra. Passa nos bares, suas horas de folga, a contar vantagens e a “resolver” problemas dos “amigos”, aonde deixa o seu dinheiro e a sua diguinidade. Ditador, ciumento, e às vezes violento, nunca tem hora certa para retornar ao lar, aonde exige o que quase sempre não deixou. – alimentação. Ama sua família, mas desconhece ser portador do alcoolismo – doença que quase todos escondem, e, por isso, questiona o porquê de tanto sofrimento.
É, pois, uma verdadeira heroína a mulher do alcoólatra, que, a tudo sofre, nem sempre com resignação, mas com o coração cheio de esperança de que um dia o quadro se reverta e passe a família a ter vida condigna, embora pobre. Faz da prece a sua tábua de salvação e da fé o seu escudo contra o sofrimento. Quando perseverante e paciente, vence, pois Deus é infinitamente bom e misericordioso.
(Texto de Jovanil Batista da Silva) - Meu Pai